quarta-feira, 25 de setembro de 2013

A Verdade (Pedro de Camargo, o Vinicius)

   A verdade não é aquilo que nos convém, nem o que nos interessa, nem o que nos é afim, nem mesmo aquilo que podemos aceitar com simpatia. 
    A verdade é o que é: é a realidade viva e crua, consoante à revelação, que os fatos atestem tantas vezes se apele para seu testemunho.
   A verdade é, muitas vezes, aquilo que não queremos que seja; aquilo que nos desagrada, aquilo com que antipatizamos, aquilo que nos prejudica o interesse, nos abate e nos humilha, aquilo que nos parece extravagante e, até mesmo, aquilo que não cabe em nós.
   A verdade não se acomoda ao homem, nem às coisas desta vida. O homem é que se há-de acomodar a ela, se a quiser conhecer e possuir.
   A verdade é sempre senhora e soberana; jamais se curva; jamais se torce; jamais se amolda. 
   Quem desconhece a verdade é indigno da mesma verdade, porque só a desconhecem aqueles que a rejeitam.  E homens há que tão repetidamente a têm repudiado que acabam por não saber mais o que ela seja, como sucedeu a Pilatos.
   A sociedade é composta por Pilatos em sua maioria, originando daí as intermináveis controvérsias e querelas em torno das questões claras e simples.
   Os homens perderam noção da verdade; tantas vezes a sacrificaram em prol de seus mesquinhos interesses. Não obstante, o mundo precisa da verdade, e sem ela não pode passar.
   Os homens empregam mil engenhos, e mil artifícios para sustentar o regime da mentira, cujos proventos imaginam fruir; mas as coisas se vão complicando de tal maneira que, num dado momento, não haverá mais engenho nem artifício capaz de suster a falsa situação em que se colocam; tal a origem das grandes comoções sociais.
   A verdade, às vezes, custa tudo o que  possuímos. Tal é a interpretação das palavras do grande Mestre da Verdade:  - “Quem não abre mão de tudo quanto tem, não pode ser meu discípulo”.

[ Extrato do livro Nas Pegadas do Mestre, de Vinicius.  FEB. Rio, 1959 ]